PF encerra inquérito sem indicar responsável por queda do avião que matou Eduardo Campos





Após quatro anos, o inquérito aberto pela Polícia Federal para investigar a queda do jatinho que matou, em agosto de 2014, o então candidato à Presidência da República, o ex-governador Eduardo Campos (PSB-PE), foi encerrado sem responsabilizar uma pessoa ou empresa pelo acidente, cuja causa principal pode ter sido tanto mecânica quanto humana. Mas afastou a hipótese de sabotagem.

As investigações para apurar o acidente, que ainda deixou outras seis vítimas fatais além do presidenciável, incluíram o depoimento de 75 pessoas, testes dentro e fora do país, simulações de computador e inúmeros laudos periciais.

Na mesma linha do que já havia concluído o Cenipa, órgão da Aeronáutica encarregado da apuração sob o ponto de vista da prevenção de futuros acidentes, a investigação da PF, que produziu 26 volumes com 4,2 mil páginas, elencou quatro hipóteses principais. Todas, contudo, não puderam ser nem descartadas nem confirmadas pela PF, que também não tem como atribuir um grau de probabilidade para cada uma.

O avião pode ter caído após uma colisão com urubus ou uma manobra para evitar um choque com os pássaros, pela desorientação espacial dos pilotos, por uma pane nos controles de arfagem (movimento de inclinação do avião), em especial no profundor, uma superfície localizada na cauda do avião que faz o nariz do aparelho apontar para cima ou para baixo, ou por uma pane intermitente numa peça ligada ao profundor, o compensador.

Por outro lado, foram descartadas as hipóteses de um golpe de vento, um desbalanceamento, uma falha no estabilizador horizontal, um ato de sabotagem, uma incapacidade ou um suicídio dos tripulantes.

O delegado que conduziu o inquérito, piloto por formação e especialista em investigações do gênero —também conduz o inquérito que apura a morte do ministro do STF Teori Zavascki—, Rubens Maleiner, reconheceu que algumas pessoas possam ficar frustradas sem uma solução mais clara sobre o que ocorreu em Santos (SP) às 13h02min do dia 13 de agosto de 2014, quando o jatinho Cessna modelo Citation C560 XLS+, de prefixo PR-AFA, despencou sobre casas em Santos (SP), matando o candidato, o piloto, Marcos Martins, o co-piloto, Geraldo Magela, e os assessores Carlos Augusto Leal Filho, o "Percol", Alexandre Severo Gomes e Silva, Marcelo Lyra e Pedro Valadares Neto.

"Sei que pode parecer um pouco frustrante, mas temos que comprovar fatos e esse acidente, com toda a complexidade, teve características peculiares. Conseguimos entender bem o que aconteceu, em termos de mecânica do voo e do sinistro, mas isso não significa que conseguimos desvendar por que aquilo aconteceu daquela maneira", disse o delegado, que apresentou à imprensa os resultados do inquérito nesta quarta-feira (8) no hangar da PF em Brasília, ao lado do perito criminal federal Guilherme Conti.

"Quando nós vamos para uma investigação como essa, nosso objetivo é esclarecer por completo, com absoluta certeza, o que aconteceu. Esse sinistro, por todas as características que nós já comentamos, não nos permitiu, nós não conseguimos atingir o grau de esclarecimento máximo. Alcançamos o máximo possível, temos a certeza de que fizemos o trabalho o melhor possível e chegamos a um limite de conhecimento sobre o fato e por isso foi solicitado o arquivamento do inquérito", disse o delegado à reportagem.

Alguns fatores, segundo a PF, impediram um resultado mais claro ao final da investigação. O primeiro foi a própria violência do impacto do avião. Os peritos calcularam que ele atingiu o solo a uma velocidade estimada entre 602 e 694 km/h. "Pela alta energia do impacto e acentuada fragmentação da aeronave, tivemos praticamente nenhum outro equipamento eletrônico que pudesse ser útil na investigação, com exceção de um elemento de um dos motores", disse Maleiner.

A explosão impediu até mesmo um exame toxicológico nas vítimas. A PF recolheu no local restos de dois tablets e um celular e os enviou para a principal empresa especializada em recuperação de dados nos EUA, na Califórnia, mas ela não conseguiu extrair nada, após quatro anos de trabalho. A polícia esperava encontrar alguma imagem feita dentro do avião antes da queda.

Outros fatores que prejudicaram o trabalho da PF foram a ausência de um gravador de parâmetros técnicos de um voo, cuja presença não era obrigada por lei, e a inatividade do aparelho de gravação de voz na cabine. Não se sabe por que esse gravador não estava acionado ou se não gravou por algum defeito mecânico. Houve ainda "limitações de dados de controle de tráfego aéreo, devido às características geográficas da região" e testemunhas "com pouca visibilidade da fase mais crítica" do voo, devido ao céu estar bastante nublado no momento do acidente.

Por meio das testemunhas e diversos dados coletados ao longo do inquérito, a PF conseguiu estabelecer que, após desistir de uma primeira tentativa de pouso no aeródromo, provavelmente devido à baixa visibilidade, o piloto fez uma curva à esquerda a uma altura estimada em 800 pés. Segundo a recomendação do aeródromo, ele deveria ter subido a cerca de 4 mil pés logo após arremeter. Ao passar pelo Monte Serrat, um dos mais altos morros de Santos, um morador da região, que segundo a PF tinha prévia experiência com aviação, observou que o avião se mantinha a uma altura estimada pela PF entre 700 e 800 pés. Ele foi taxativo, de acordo com a PF, em afirmar que um bando de urubus sobrevoava a região no mesmo instante. O horário, segundo a PF, é condizente com a presença de urubus naquele ponto.

Logo depois disso, o avião entrou numa área de grande nebulosidade e nenhuma testemunha conseguiu informar qualquer dado sobre altura ou velocidade do jatinho. Perto desse momento, o co-piloto entrou em contato com o controle o tráfego aéreo: "Devido às condições, nós vamos su... é... Nós vamos aguardar e, e chamaremos novamente, ok?"

Um minuto depois, o avião despencou sobre casas em Santos. "Entender o que se passou nessa fase nebulosa passou a ser o grande desafio para nós. Foi um espaço físico muito pequeno para um avião que estava em condições controladas de voo, estáveis, terminar da forma como terminou", disse o delegado.

A PF estabeleceu, recorrendo a uma série de dados e programas de computador, a hipótese de que o avião fez uma grande curva ascendente até passar de 4 mil pés de altura, contra os 800 em que estava antes de entrar nas nuvens, mas logo em seguida, no entanto, desceu rapidamente da mesma forma "radical", na expressão do delegado Maleiner, até bater no solo. O que aconteceu nesse meio tempo ficou descrito, no inquérito, como as quatro hipóteses citadas pela polícia.

A PF também concluiu que o avião estava em condições normais e em boas condições de manutenção, assim como "não foram encontrados elementos para afirmar que a conduta dos pilotos em voo foi ruim". Eles tinham descansado 40 horas, de 48 horas preconizadas, mas essa diferença, segundo a PF, não permite falar em fadiga. Embora o piloto não tenha subido de imediato para 4 mil pés, após a arremetida, isso não significa que a decisão automaticamente levou ao acidente.

"Fica evidente que o problema começou perto do morro [Serrat]. Ou por uma desorientação espacial, ou seja, os tripulantes perderam as referências visuais e daí podem ter aplicado comandos na aeronave exagerados e incorretos. Todavia, convém lembrar que tínhamos ali um piloto experiente já familiarizado com o avião, e um segundo piloto está presente. Sem dúvida é uma possibilidade. Mas não vimos elementos robustos para fazer essa hipótese ser superior às demais", disse Maleiner. O caso agora está sob análise do Ministério Público Federal, que pode ou não concordar com as conclusões da polícia e, depois disso, encaminhará manifestação à Justiça Federal.

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