Esquerda busca turbinar CPI e desgastar Bolsonaro nas ruas

por Joelmir Tavares e Thiago Resende | Folhapress

Esquerda busca turbinar CPI e desgastar Bolsonaro nas ruas
Foto: Reprodução/ Rede Brasil Atual



Com manifestações em mais de 110 cidades, incluindo as 27 capitais, marcadas para este sábado (29), a esquerda irá às ruas contra Jair Bolsonaro (sem partido) pensando em desgastar o presidente e impulsionar a CPI da Covid, enquanto o impeachment é visto como algo ainda distante.

 

Embora partidos e movimentos por trás da convocação afirmem que o mote "fora, Bolsonaro" traduz o desejo de afastamento imediato, líderes admitem haver obstáculos para o desenrolar de um processo. Eles, no entanto, enxergam as mobilizações como um passaporte que pode levar a esse destino.

 

Como mostrou o jornal Folha de S.Paulo, forças da oposição de esquerda a Bolsonaro estavam rachadas nos últimos meses sobre fazer atos populares em meio à pandemia de Covid-19, mas entenderam que o descontrole do vírus e os índices de desemprego e fome exigem a realização de protestos.

 

O dilema entre o discurso pró-isolamento social e o incentivo a aglomerações resultou em diferentes níveis de participação. A CUT (Central Única dos Trabalhadores) e o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) não estão convocando seus integrantes institucionalmente, embora não impeçam a ida.

 

PT, PSOL, PC do B, PCB, PCO e UP declararam apoio à iniciativa e estão disparando chamados para os militantes, mas ressaltam que a organização é de responsabilidade de frentes sociais como Povo sem Medo, Brasil Popular e Coalizão Negra por Direitos (que congregam dezenas de entidades).

 

Para neutralizar as críticas, que já surgem tanto entre apoiadores quanto entre detratores do governo, os articuladores têm espalhado orientações de segurança para as pessoas que irão aos atos, como o uso de máscara do tipo PFF2 e a ordem de manter distanciamento nas passeatas.

 

A avaliação é que o impeachment pode ganhar força a partir da ocupação das ruas. Por isso, o esforço é para pressionar o centrão, fiel a Bolsonaro e uma barreira para o processo na Câmara, e o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), a quem cabe desengavetar um dos 114 pedidos protocolados.

 

A tese de que o PT, um dos partidos que puxam os protestos, teria interesse em "sangrar" o presidente até a eleição de 2022, em vez de trabalhar pela saída dele do cargo durante o mandato, foi negada por líderes do partido e de legendas aliadas que foram ouvidos pela reportagem.

 

O discurso é o de que, ainda que nomes petistas defendam a estratégia nos bastidores, ela não tem respaldo da direção da legenda nem do ex-presidente Lula, que é pré-candidato e lidera as intenções de voto para 2022, segundo o Datafolha --com 41% no primeiro turno, ante 23% de Bolsonaro.

 

O PT se animou com a pesquisa do instituto que mostrou em maio apoio de 49% da população ao impeachment (em março, a opinião era endossada por 46% dos entrevistados) e com a repercussão da CPI no Senado que apura as responsabilidades do governo na crise que já deixou mais de 452 mil mortos no país.

 

"A CPI está trazendo informações importantes", diz a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann. "Com os depoimentos, vemos os erros e omissões do governo, de uma maneira formal, e não só pela imprensa. Isso vai formar a base que dá sustentação a uma ação contra Bolsonaro."

 

Segundo a deputada federal, o impeachment é um processo político e, diante da projeção de perda de apoio do governo, seria possível concluí-lo até o fim do ano. "Vamos mostrar que o povo está descontente e que nós não concordamos com o que está acontecendo no Brasil."

 

Em fevereiro deste ano, ainda antes de sua reabilitação eleitoral, Lula afirmou que acreditava não haver tempo hábil para a conclusão de um processo contra Bolsonaro. Em entrevistas posteriores, o ex-presidente disse que havia, no entanto, motivos suficientes para depor o rival e culpou Lira pela falta de reação.

 

Na semana passada, questionado sobre a influência da CPI em um pedido de impeachment ou cassação, o petista respondeu: "A CPI está cumprindo um papel importante, que é estabelecer a verdade nua e crua do que aconteceu neste país. Veja, ninguém quer condenar ninguém. O que precisa é apurar os fatos".

 

Lula afirmou ainda ver "responsabilidade direta" do adversário nas mortes e no fracasso do combate da pandemia. "A CPI é fundamental. Não sei qual será o resultado dela, mas está prestando um serviço enorme à democracia brasileira e na recuperação da verdade", avaliou.

 

Para o pré-candidato do PSOL ao Governo de São Paulo, Guilherme Boulos, o único fator que falta para criar o clima para o afastamento do presidente é a rua. "Já temos a perda de popularidade e as crises política e econômica. Bolsonaro está se tornando tóxico até para o centrão, que não hesitará em abandoná-lo."

 

Segundo Boulos, que é um dos coordenadores da frente Povo sem Medo e está engajado no chamamento para os atos, as manifestações "apontam para a perspectiva do impeachment, mas têm também um efeito imediato de ser uma resposta da sociedade, de demonstrar o repúdio aos atos do governo".

 

"Essa história de 'sangrar Bolsonaro' [não faz sentido]. Quem está sangrando é o Brasil. Se não for feito nada, o país vai virar terra arrasada. Estamos falando de vidas. Não dá para nenhum cálculo político menor pautar a nossa mobilização", acrescenta.

 

Boulos diz não ter "a menor dúvida" de que, se em algum momento avançar no Congresso o processo contra Bolsonaro, "toda a esquerda vai empurrar".

 

As manifestações deste sábado abraçam ainda pautas como a aceleração da vacinação contra a Covid, o retorno do auxílio emergencial de R$ 600, a luta antirracista, o combate à violência policial, o ataque às privatizações e a defesa da educação pública.

 

"Acho que tem tudo para começar a florescer um clima na sociedade [pela saída de Bolsonaro], mas o que mais precisamos neste momento é de vacina e auxílio de R$ 600. Não pode ser só impeachment e deixar de lado os outros temas", diz João Paulo Rodrigues, da direção nacional do MST.

 

Apesar do ceticismo sobre o avanço do processo contra Bolsonaro, a ida às ruas se tornou imperativa, de acordo com Raimundo Bonfim, coordenador nacional da CMP (Central de Movimentos Populares). "Nossa posição é pelo impeachment. Se vamos conseguir ao fim dessas mobilizações, aí é consequência."

 

"Acredito que a CPI pode ser o estopim, evidenciando a responsabilidade do governo. Os senadores estão colhendo todas as provas, enquanto o presidente zomba do sofrimento do povo", afirma.

 

Nesta quarta-feira (26), centrais sindicais e movimentos sindicais fizeram um protesto em Brasília, no gramado em frente ao Congresso Nacional, para denunciar o aumento da fome no país, reclamar da gestão da crise sanitária e pedir o reajuste no valor do auxílio emergencial.

 

A iniciativa foi tratada como um ato simbólico, com a presença de número reduzido de pessoas e transmissão dos discursos pelas redes sociais. Os manifestantes procuraram congressistas para expor suas bandeiras e fizeram doação de alimentos para catadores de material reciclável.


Bahia Notícias

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